quinta-feira, 8 de outubro de 2015

Tudo novo, de novo

  Leia e ouça: Let it go

  Você dizia sem parar que na vida tudo muda de lugar. É um vai e vém de ruas, esquinas, gente... Entre olhares e sorrisos, tudo novo de novo. Era tudo novo com você por aqui, o par de olhos no espelho, os cabelos espalhados no travesseiro, e mais uma xícara na mesa do café. As mãos dadas nas alamedas, as flores coloridas nos canteiros, canções que soavam pelos cantos da cidade por onde a gente passeava sem se preocupar.
   Odeio admitir que você estava certo. Tudo muda de lugar. Inclusive você,  e nós dois. A casa amarela, ainda estática na mesma avenida, por dentro anda meio vazia. O cheiro do perfume, o violão no cantinho da porta, a camisa jogada na cama, tudo fora do lugar. Tudo num outro lugar, tão longe daqui. Sentada na sua poltrona preferida, olho as nuvens caminhando pelo céu... Percebo que sou uma delas agora.
   Sou como a nuvem, que tem cara de algodão e sabor azul. Sou como a nuvem que paira, meio vazia meio cheia e ameaça chover. Sou a gota de chuva que cai, e chora a saudade de quem um dia foi par. Sou o vapor d’água que volta pro céu, na nova tentativa de nascer de novo. Sou eterno recomeço desde o dia que você se foi. Sou as notas daquela música, que tocou no rádio, arranjadas numa nova melodia pra tentar te esquecer. Sou um barco seguindo outro rumo pra me encontrar no próximo porto.
   Recomeçar, é muito mais do que começar de novo. É se permitir, e só a gente sabe a dor a delícia de cada vírgula rabiscada onde um dia esteve um ponto final. A vida é sim uma eternidade de recomeços como um dia você me falou,  eu só não esperava que fôssemos mais um.

   As nuvens ficam pesadas, o céu escurece e vejo a natureza renascer diante dos meus olhos, com as gotas molhando o vidro onde antes refletiam dois. O reflexo desta vez é singular, mas não sozinha. Estou aqui, sentada vendo a chuva cair, de mãos dadas a  todas as oportunidades dessa viagem que me permiti, pra me perder do passado e me encontrar com o presente. O presente que a vida me deu.

*Este texto faz parte de uma postagem coletiva dos Escritores da Era do Compartilhamento com o tema "Recomeço''. Abaixo, textos relacionados, dos outros participantes do projeto:

Quando a gente recomeça. - Sâmela Faria
Recomeçar: Existe vida além do término. - Valter Junior
Outros dias virão, sempre. - Juliane Rodrigues
Eu não sou sua vítima. -  Leca Lichacovski

Um comentário:

  1. "O reflexo desta vez é singular, mas não sozinha."

    Que texto magnífico! Li cada linha imaginando os dois!
    Beijo Nath! :*

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