quarta-feira, 30 de setembro de 2015

O nosso lugar

Leia e ouça: Scars

    Aprendi há algum tempo que lugares são afetos. Lugar é muito mais do que espaço, ou uma mera localização no GPS... Lugares são memórias, pedacinhos espalhados dentro do coração. Lugares carregam consigo cheiros, lembranças, histórias e marcas feitas em nós e nos outros.
   E hoje eu passei por aquela estação. O nosso lugar. Nosso e de mais uns milhões de pessoas que atravessam São Paulo pra trabalhar e estudar, e passam por ali desatentos, apressados. Eu não. Aquele cantinho da estação Fradique Coutinho...Lugar que hoje era frio, espaço hoje vazio, que na minha imaginação ainda te aguardava chegar.
    Olhei esperançosa, procurando entre a multidão um só rosto especial. O teu. Os olhos pequenos, um tanto míopes, o sorriso largo, bastante simples, caminhando na minha direção, enquanto dentro de mim eu segurava a alegria, tentando conter aquilo que os outros em volta já viam.
   Hoje ele não veio, repeti pra mim mesma no momento em que passei a catraca. Ele não vem mais, engolia as lágrimas que se formavam no cantinho dos olhos enquanto descia as escadas. E não foi mesmo. E não virá mais. O trem demorou tanto a chegar, ao contrário dos dias em que estávamos juntos, quando ele voava e me levava pra longe de ti. Consegui contar os passos das pessoas ao meu redor, diferente de quando ficamos horas ali encostados na mureta de vidro, esquecendo do mundo lá fora.
   Observei alguns casais nas poucas estações que passaram até eu descer, percebi que de alguma forma aquele lugar nunca foi exclusividade nossa, pelo contrário. Mas eu nunca me importei com isso, por sempre estar com você. Acontece que o sempre também acaba, né?
   Agora entendo porque é que passei meses fazendo os caminhos mais longos pra casa. Evitava passar ali, evitava os fantasmas todos que aquele lugar ainda me causa. Fugia de você, ainda tão presente ali. Presente na catraca me esperando, ainda vivo na escada rolante competindo pra ver quem chegaria primeiro quando eu subia os degraus estáticos, seu rosto estampado no vidro do trem que passa me deixando pra trás.
   Percebo assim, que lugares são tão inesquecíveis quanto pessoas. E capazes de emanar amor tanto quanto elas. Gosto de te lembrar, ainda que me doa ás vezes me lembrando de todas as cicatrizes. Gosto de saber que lá sempre será o nosso lugar, ainda que haja uma próxima estação pra descer, é lá que posso te encontrar sem precisar te esquecer.

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